quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Fantasias de natal


Começou a se preparar com muita antecedência. Separou a indumentária, barbeou-se, checou sua bagagem, banhou-se e perfumou-se. Enviou-lhe uma mensagem pelo celular, dando a entender que demoraria a chegar, pois havia se atrasado. Tinha uma dupla intenção nesse falso aviso: aumentar-lhe a expectativa da espera e surpreendê-la um tanto desprevenida. Devidamente paramentado, olhou-se no espelho, sorriu esfregando as mãos, estufou o peito: “É hoje!” – disse pra si mesmo. Tomou o elevador de serviço. Saiu imediatamente.
Haviam combinado em detalhes essa noite. “Encontrei uma parceira ideal”, pensava. Na verdade, aqueles meses de convívio com ela, intensos meses, o haviam rejuvenescido. Voltara a dar asas à imaginação, a sentir o gosto pela aventura; voltou a sentir-se pleno em seus desejos. E isso tudo porque percebia terem uma enorme afinidade, ao ponto de não sentirem qualquer vergonha em expor seus gostos, manias, idéias.
“De quem partiu a sugestão de hoje?”. Não conseguia lembrar-se. O fato é que planejar mais esse inusitado deixara os dois excitadíssimos. Guiava velozmente, dirigido pela ânsia. A casa ficava afastada da cidade, situada em local não muito urbanizado, com ares de região serrana, ou rural. Aproximava-se.
Desligou os faróis do carro, reduziu a aceleração à mínima possível, estacionou. Pôs-se a calcular a melhor maneira de descer. Pensava e ria-se baixinho. Nunca representara um Papai-Noel antes nem tampouco descera por uma chaminé. A missão era dificultada pelo saco que carregava, no qual trazia algumas garrafas de vinho – cuidadosamente envoltas em isopor – e uma pequena variedade de apetrechos e objetos de fetiche sexual.
Caminhando pela lateral da casa avistou facilmente a longa escada que dava acesso à chaminé. Enrolou e amarrou a sacola em seu braço e preparou-se para subir. Deveria encontrá-la chateada pela demora; nem sequer havia lhe retornado a mensagem. “Essa raiva passa logo!”, exclamou o lúbrico invasor.
Galgou o último patamar da escada, apoiou-se no beiral e aprontou-se para o salto. Você leitor, acaso estivesse vendo a cena, poderia perguntar por que a porta da sala estava escancarada e alguns móveis em desalinho. Mas, garanto, sua pergunta seria desnecessária.
Ao tocar o chão e pôr-se ereto, os olhos recebem a surpresa. Mal teve tempo para sustos; e mal pode mirá-la, lívida, no sofá. No meio da sala, com a arma em punho, o marido o esperava avidamente.

4 comentários:

Anônimo disse...

Josias,

Essa foi genial! A imagem do texto induziu a minha imaginação a seguir por outros caminhos. Por isso mesmo a surpresa. Acho até que você fez de propósito.

Além do mais, você tem essa capacidade de dar um desfecho inesperado. É talento, velho.

Mas confesso aqui. Fiquei com uma pena da peste do papai noel.

Um grande abraço,

Dimas

A Autora disse...

Josias, Dimas já disse tudo. Talento está lhe sobrando, se quiser se livrar do excesso, por favor, jogue lá na minha lixeira!
Vou me ausentar por uns dias, mas torço para que o seu feriadão natalino seja uma maravilha, e sem os finais surpreendentes dos seus contos! rs.
Beijo.

Franciel disse...

Meu velho,
Marconi me disse que você escreve muito bem e que seu blog é o tal e etc e tals.
Como não confio no dito cujo, vim conferir pessoalmente. E, qual minha surpresa, descubro que o infeliz, pelo menos uma vez na vida, falou a verdade.
abraços.

Anônimo disse...

muito bom! a mudança narrativa no final com o "Você leitor.." foi muito interessante. voltarei