sexta-feira, 29 de maio de 2009

Citações


Como prometido, postarei mais dois poemas de Alexei Bueno. Alexei Bueno completou, há cerca de um mês, 46 anos. Nasceu em 26 de abril de 1963. Em 1981 - portanto vê-se que se trata de um poeta desde cedo marcado pela força da poesia - lança As escadas da torre. Pode-se destacar ainda Livro de haicais (1988), A decomposição de J. S. Bach (1989) e Lucernário (1993). É responsável também por organizações de antologias (Machado de Assis e Augusto dos Anjos, por exemplo) e textos críticos.
Por fim, um poeta a quem, modestamente, admiro bastante.
Seguem:

Quem versos como eu fiz
Fez, pode sossegado
Dormir, sentindo o intenso
Prazer de se ver vivo.

Quem tal como eu cantou
O que não passa no homem
Medo não tem que o tempo,
Passando, o não mais passe.

Pois quando o divino ar
Não mais, como foi sempre,
Entrar pelo meu peito,
Aos homens falarei

Ainda, qual o espectro
Dos mortos, e assim ouso
Calmo dormir, enquanto
Minhas palavras velam.

(De
Poemas Gregos, 1984)

E, como último exemplo:

Crepuscular

Pobre homem... ele olha bem feliz
A coleção de livros quinzenais
Que ele hoje terminou, para nunca mais,
A única completa, como o quis.

Lá fora a tarde cai... e o vento vem...
Na estante ele sorri, (frente a avenida)...
- A única completa numa vida!
Pros séculos dos séculos Amén...

(De As escadas da torre, 1981)



terça-feira, 26 de maio de 2009

Poema


Dísticos de fim de tarde


Neste momento a luz se põe na folhagem

Lembrando que o tangível é uma miragem


O sol outorga o final de mais um dia

E espalha a violácea melancolia


Meus gestos são engodos, meu rosto máscara

Capas a me proteger da vida áspera


Se me esgueiro da rotina que oprime

Ao meu alheamento se imputa um crime


Sou minha sombra animada, ser que se oculta

Insurreto covarde que teme a luta


E se julgo à tristeza passar imune

A solidão me assalta e crava e pune

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Citações


Ele é, com certeza, um dos maiores poetas brasileiros da última quadra. Possui amplo domínio das formas, riqueza imagética e rítmica. Em um ambiente impregnado da superficialidade "pós-moderna", sua obra resta como um exemplo de força e rigor criativos e, sobretudo, de respeito pelos seus leitores. Nos próximos dias publicaremos alguns poemas de sua lavra. Quem é tal poeta? Alexei Bueno.
Segue uma primeira prova, um soneto:

O Velho

Este, que dormir pode em plena rua,
Na tarde ondeante, à beira dos passantes,
Este sim, pôde se livrar da sua
Infãncia clara e dos seus sonhos de antes.

Imundo, em meio às tranças transbordantes
Armadas pelo que o seu corpo sua,
Como num leito oculto em véus brilhantes
Sonha, soberbo, enquanto o sol recua.

Maior que os outros na cidade
Que freme, uma terrível majestade
Lhe orna a face, impossível de ofender.

Se um povo já houve ali, não há mais nada.
E ao erguer-se, talvez na madrugada,
Nem um rosto haverá para o esquecer.




terça-feira, 19 de maio de 2009

Poema


Haikais
(Inspirados num antigo pedinte da Boa Vista)


O anseio da alma -
sonho que não se redime:
por trás da vitrine.


No lixo, a comida.
Sorve com fome de rato
a seiva da vida.




sexta-feira, 8 de maio de 2009

Considerações


Reflexão

Que tanto orgulho!
Que tanta empáfia!
Se tu sabes que para fazer algo,
esboçar qualquer murmúrio,
uma vida só não basta.



Poema

Meu poema

A poesia seca em profundo silêncio:

o imenso deserto de palavras

e o branco absoluto do papel.

À morte da poesia

nem sequer um epitáfio.

O dizível sangra em hemorragia;

verte o nada, a língua,

num esforço gago e pífio.

Paralisa a pena

e fermenta apodrecido,

nisso,

o meu poema.